Estamos assistindo ao fim da fronteira entre a comunicação interna e a comunicação externa.
*Tania Magalhães
As redes sociais e o mundo digital não são o inimigo. Muito pelo contrário, representam uma quantidade quase ilimitada de opções para que as empresas se comuniquem com seus diversos stakeholders - e eles são muitos. Por que isso? Porque estamos assistindo ao fim da fronteira entre a comunicação interna e a comunicação externa.
É inescapável. A comunicação será, cada vez mais, integrada; e as companhias precisam entender (já) que não existirá controle central do que é dito, lido, visto ou ouvido pela e sobre uma marca. Sim, perder o controle sobre a informação não parece algo salutar, mas aqui estamos falando da realidade que se impõe, não do que desejamos. E qual a melhor maneira de garantir que a informação gerida e gerada internamente esteja em consonância com a externa? Verdade acima de qualquer outra coisa, e coerência em tudo o que fizer.
Lembre-se de que nada adianta criar uma autoimagem de responsabilidade social, sustentabilidade, alta tecnologia, respeito à diversidade e à inclusão e preocupação com o bem-estar dos funcionários se essas premissas não condizem com o que as pessoas percebem das ações da empresa. Estamos cercados por comentaristas online, 24 horas por dia. E eles têm seguidores, que, por sua vez, têm mais seguidores. Por causa disso, não é exagero dizer que crises institucionais podem ser criadas em instantes e têm alto potencial de desintegração da reputação de uma marca.
Como se defender disso é que é o grande desafio da década - e eu diria, até, do século. Recente pesquisa PR Scope, realizada pela Scopen sobre o nosso setor (Comms & PR), informa que as empresas estão cada vez mais interessadas em uma comunicação que integre especialidades diversas. Isso seria feito via grupos de trabalho dedicados a temas específicos. Com destaque para Comunicação Corporativa (com 76% das respostas); Comunicação/Gestão de Crises (72%); Comunicação de Marca/Produto (55%); e Influencers/Bloggers (36%). Este último, diga-se, quase duplicou de tamanho desde a última edição da pesquisa, realizada em 2017. Para a edição 2019, a Scopen ouviu 323 altos executivos de Comunicação de empresas nacionais médias e grandes.
Outro ponto para o qual vale chamar atenção é o que mede o quão importantes os três formatos de mídia são para essas companhias. As chamadas Owned Media (26%) e Paid Media (27%) estão em franca expansão, tendo crescido mais de 10 pontos percentuais entre 2017 e 2019. Já a Earned Media (com 47%) perdeu terrenos nos últimos anos. Ou seja, as empresas estão investindo em mídia direcionada, com destaque para campanhas pagas em redes sociais, Google Adwords, patrocínio de influenciadores e até a mídia tradicional, como rádio e televisão - mas em canais/programas nichados.
A pesquisa também questionou os executivos a respeito das possíveis barreiras para a implantação de uma comunicação digital mais vigorosa e presente. E teve um feedback bastante importante: se, em 2017, apenas 2% deles não enfrentavam nenhuma barreira interna/administrativa para investir nesse tipo de mídia, agora, cerca de 25% se sentem livres e desimpedidos para agir no mundo virtual.
Eis um dado fundamental, porque, como sabemos por experiência empírica, ignorar as potencialidades do digital pode significar abreviar a vida da empresa e de seus produtos ou serviços. Neste universo fluido em que vivemos, vale a máxima de um amigo, fundador e presidente de já extinta grande empresa, vítima do que chamo de "comunicação afônica", que, perguntado sobre como havia se dado sua falência, respondeu: "No começo, foi devagarinho, mas, no fim, foi rápido!".
É preciso ter esse tipo de chiste (verdadeiro e muito comum) em mente a cada tomada de decisão no ambiente corporativo, principalmente quanto à comunicação. E também levar em conta uma matemática extra: seu mercado consumidor está cada vez mais tomado pela chamada Geração Millennial, nascida a partir de 1980 e até o fim dos anos 90. E ela tem características únicas - e bastante complexas.
Também conhecida como Geração Y, representa, atualmente, cerca de 20% da população mundial - no Brasil, são 55 milhões de pessoas, segundo dados do IBGE . Por definição, elas nasceram com a certeza de que é possível colocar a vida inteira (incluindo relacionamentos, entretenimento e todo tipo de dados pessoais ou profissionais) em seu bolso - literalmente. Mais: segundo recente pesquisa da Accenture , daqui a uma década, os Millennials serão mais de 75% da força de trabalho no mundo inteiro. Ou seja, estarão dando as cartas.
Uma geração tão plural quanto a Y, com enorme acesso a informações sobre absolutamente tudo, não é tão fácil de ser convencida por discursos e anúncios. Os Millennials são exigentes e estão sempre atentos: para eles, uma compra não representa apenas uma compra. Significa, principalmente, valores éticos que querem passar para seu círculo social, dentro e fora das redes sociais. Ou seja: para se tornarem relevantes à Geração Y, as marcas precisam trazer consigo posicionamentos claros sobre assuntos tão díspares quanto sustentabilidade, racismo e homofobia. E nós, profissionais da comunicação corporativa, precisamos estar up to date em relação a essas necessidades.
Até por isso, não surpreende que a pesquisa da Scopen sustente que uma maneira de falar ao coração do cliente/usuário/consumidor seja por meio de cases estrelados por pessoas "reais" (a exemplo do que temos visto nas redes sociais, em que influencers se tornaram as vozes da vez). Isso porque, segundo o estudo, os executivos de Comunicação estão muito mais atentos à carteira de cases das empresas de PR - fundamental para 86% dos entrevistados na hora de contratar serviços. Em segundo lugar na lista vem a recomendação de colegas, com 75%.
Um último ponto que vale ressaltar na pesquisa diz respeito ao conhecimento, à criatividade e capacidade de inovação das empresas/profissionais de comunicação e PR. Segundo o levantamento, a agência exemplar precisa ter amplo conhecimento do cliente, do mercado e das marcas (em 2017, esse item representava 41% das respostas; na atual edição, subiu para quase 59%). Criatividade e ideias inovadoras, citadas por 32% dos executivos em 2017, agora são essenciais para 40%; e o planejamento estratégico das mídias foi citado por 31% dos entrevistados (em 2017, apenas 19% se lembraram desse item).
O fato é que a realidade da Comunicação Corporativa muda a cada estação, mas a boa notícia é que, mais do que nunca, temos um universo de dados com os quais trabalhar - e ferramentas à disposição para tentar traduzi-los, compreendê-los e nos manter à frente da concorrência.
*Por Tania Magalhães, diretora de Comunicação do PayPal Latam
Fonte: IT Forum 365
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